Na Grande Vitória, 667 toneladas de alimentos são descartadas ao dia. Especialistas dizem que mudança na legislação pode evitar desperdício
Na Grande Vitória, 667 toneladas de alimentos são jogadas no lixo por dia, de acordo com o Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana do Espírito Santo (Selures). Para especialistas, é a legislação que obriga que os supermercados e restaurantes descartem as comidas.
Os números são referentes ao ano passado e consideram os municípios de Vitória, Vila Velha, Cariacica e Serra. De acordo com o presidente do sindicato, Marco Antônio Valente, o lixo orgânico equivale a 50% do total recolhido, e o ideal era que fosse 25%.
A mestre em Direitos e Garantias Constitucionais Fundamentais Brunella Piras Coser explicou que os alimentos de supermercados e restaurantes são descartados devido à rigidez das resoluções da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Como exemplo, ela citou que no Brasil a punição é grande para aqueles que entregam alimentos ao consumo após vencido o prazo de validade. “É preciso haver mudança na legislação para permitir o aproveitamento”, destacou.
Mestre em Tecnologia de Alimentos e doutoranda em Ciência de Alimentos, Maraysa Rodrigues Furtado explicou que o prazo de validade é determinado avaliando características sensoriais, como cor e textura, e microbiológicas.
“Alguns alimentos podem estar fora da validade e aptos ao consumo humano, apresentando apenas alterações no teor nutricional ou aparência, por exemplo”, afirmou. Ela explicou que isso significa que eles estão microbiologicamente seguros, não fazendo mal à saúde.
Para a chefe da Área Técnica de Alimentos da Vigilância Sanitária de Vitória, Renata Santos Brega, é possível trabalhar essa informação de forma a permitir o aproveitamento dos alimentos, sem trazer risco ao consumidor, mas deixando claro para o mesmo que já ocorreu uma alteração da qualidade.
Para especialistas, um dos caminhos é desenvolver uma metodologia para estabelecer o limite de segurança, a partir do qual o alimento pode causar danos à saúde.
Eles ressaltam que o controle deve ser rigoroso, já que, conforme destacou o professor da Ufes e infectologista Crispim Cerutti Junior, consumir alimentos contaminados pode levar até a morte.
Cuidado com a data de validade
Os produtos são retirados das prateleiras dos supermercados Extrabom até um pouco antes de vencer, garantiu o presidente da rede, Luiz Coutinho. “Grande parte deles ainda está em condições de serem consumidos, mas não podem ser comercializados por causa da legislação”.
Segundo o diretor de Infraestrutura de Prevenção de Risco da rede, Eliomar Avancini, produtos vencidos são descartados em empresa licenciada. As carnes são recolhidas por empresas autorizadas e transformadas em ração e alguns produtos são trocados pelos fornecedores.
Para aproveitar, é preciso evoluir, dizem prefeituras
Para a chefe da Vigilância Sanitária de Vitória, Renata Santos Brega, a legislação sanitária, da forma como está hoje, visa à promoção da saúde e prevenção dos riscos, estabelecendo diretrizes para a segurança dos alimentos ao consumo humano. “Precisamos evoluir no aproveitamento dos alimentos”, destacou.
A Prefeitura de Vila Velha enfatizou que o objetivo principal da legislação é prevenir o adoecimento da população que virá a consumir os produtos.
Já para a fiscal da Vigilância Sanitária de Cariacica, Lorena Vettoraci, a legislação hoje simplesmente proíbe o reaproveitamento de alimentos. Mas questiona: “Se o risco de adoecer consumindo esses produtos é muito alto, quem vai se responsabilizar?”.
A gerente de Vigilância Sanitária da Serra, Geane Souza Sobral Nascimento, destacou que há muito que se avançar em relação a isso.
Ela explicou que a Serra está no caminho, pois teve a aprovação de um projeto de lei que prevê a utilização de alimentos que perderam valor comercial e estão próprios para consumo.