Decisão provisória da Procuradoria Geral do Município de Governador Valadares obriga a Fundação Renova e as mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton a pagar R$ 6.361.497,87; organização informou que vai cumprir a determinação judicial
Em sua decisão, o juiz Roberto Apolinário de Castro avaliou que, com a exigência imposta às prefeituras, a Fundação Renova “abusa de seu poder de forma a obter o fim almejado, devendo o Poder Judiciário agir de forma a controlar este poder, definindo o que pode ou não ser realizado”. “A coação, consubstanciada na imposição de condição para o recebimento da indenização ofertada, a que ela já se obrigara anteriormente, beneficiaria as mantenedoras da fundação e eventualmente suas controladoras, o que caracteriza a defesa de interesses de terceiros”, acrescentou o magistrado em seu despacho.
Ao deferir o pedido da Prefeitura de Governador Valadares, o juiz declarou nula a exigência imposta pela Renova de que o município abrisse mão de ações contra a entidade, determinando ainda o pagamento da quantia acordada com a administração municipal, de R$ 6.361.497,87, no prazo de cinco dias. A decisão fixou ainda multa diária de R$ 1 mil, limitada a R$ 500 mil, em caso de descumprimento.
O advogado Tom Goodhead – um dos sócios do escritório anglo-americano SPG Law, que propôs uma ação de 5 bilhões de libras (mais de R$ 24 bilhões) contra a BHP Billiton nas cortes da Inglaterra e do País de Gales como compensação às vítimas da tragédia da Samarco – comemorou a decisão. “Vínhamos nos sentindo desapontados e indignados com as tentativas da Renova de frustrar a Justiça brasileira e do Reino Unido”, afirmou, dizendo esperar que o posicionamento “sirva para embasar as ações de todos os procuradores municipais” que enfrentam a mesma situação.
Outras prefeituras atingidas pelo rompimento da Barragem do Fundão também brigam na Justiça para garantir o recebimento da indenização por gastos extraordinários decorrentes da tragédia. As ações movidas pelas prefeituras ingressam em comarcas afetadas em Minas Gerais, como de Governador Valadares, Itabira, Ponte Nova e Viçosa, e outras no Espírito Santo. Em quase todas as ACPs, os procuradores de Justiça dos municípios pedem tutelas antecipadas de urgência, que são medidas processuais provisórias para a obtenção dos direitos às indenizações, prevenindo prejuízos antes do julgamento. A Renova, antes mesmo de ser citada, já vinha propondo defesas jurídicas contra os pedidos de tutela antecipada de urgência. Em um dos casos, ao qual o EM teve acesso, a fundação pedia que houvesse audiência de conciliação antes da decisão, além de demandar a remoção do foro de julgamento da comarca a que pertence o município para a 12ª Vara da Justiça Federal de Belo Horizonte e que a tutela antecipada não fosse concedida. A fundação argumenta que a 12ª Vara é o foro universal da ação.
Termo polêmico
Em abril de 2016, seis meses após o rompimento da Barragem do Fundão, operada pela mineradora Samarco, foi assinado um Termo de Transação de Ajustamento de Condutas (TTAC), envolvendo as controladoras dessa empresa – que são a Vale e a BHP Billiton –, a União, os governos de Minas Gerais e do Espíritos Santo, bem como os órgãos ambientais e fiscalizadores desses entes. Nesse acordo foi criada a Fundação Renova e se estabeleceu uma indenização para os gastos públicos extraordinários com a tragédia dos estados e de 39 municípios.
Contudo, em 16 de novembro passado, as prefeituras de municípios atingidos denunciaram que o recebimento dos recursos acertados estava sendo condicionado à desistência de ações no Brasil e no exterior, o que consideraram uma forma de chantagem. No parágrafo oitavo de documento apresentado às administrações municipais, a Fundação Renova estabelecia que “o município renuncia a quaisquer outros direitos eventualmente existentes, presentes ou futuros, para nada mais reclamar em tempo e lugar algum, a qualquer pretexto, em relação a alocações e gastos públicos extraordinários decorrentes do rompimento”. Com isso, a fundação e suas mantenedoras (Samarco, Vale e BHP) estariam “desobrigadas inteiramente, com validade e eficácia no Brasil e em qualquer outra jurisdição estrangeira”.
Esse termo de quitação fazia, ainda, uma menção específica ao processo que o escritório anglo-americano SPG Law move contra a BHP Billiton PLC, nas cortes da Inglaterra e do País de Gales, uma causa que pode ultrapassar 5 bilhões de libras (mais de R$ 24 bilhões), conforme a reportagem do EM adiantou em 21 de setembro. “O município desiste da ação coletiva movida perante a High Court of Justice em Liverpool – Reino Unido contra a BHP Billinton PLC, BHP Billiton Brasil Ltda., Samarco Mineração S.A., BHP International Finance Corp., BHP Minerals International LLC e Marcona Intl. S.A.”, diz trecho do documento. E o texto prossegue, indicando que a prefeitura deverá “comunicar tal desistência às cortes inglesas e a quem mais se fizer necessário”.