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As desigualdades raciais na advocacia

A desigualdade racial é gritante nos maiores escritórios de advocacia, havendo participação quase nula de pretos/as e pardos/as em seus quadros, seja como sócios/as, associados/as e estagiários/as

As discussões sobre desigualdade racial no Brasil tratam, dentre outros temas, da marginalização da população preta e parda no contexto de diversos setores da sociedade e do mercado de trabalho. Todavia, durante muito tempo prevaleceu o argumento de que a raça não seria um fator gerador de desigualdades e que o Brasil era um país sem barreiras para que qualquer um – inclusive as pessoas negras – alcançassem cargos de prestígio, bastando esforço e dedicação.

E é isso a que se pode caracterizar o “mito da democracia racial” e da ilusória “meritocracia”, já que as oportunidades e os privilégios não são os mesmos para todos. Em regra, é notável como os dados referentes à população parda e preta sempre apontam como estas populações se encontram em situações marginalizadas que dificultam, sim, o alcance ao mercado de trabalho. Por exemplo, no caso da violência, a pesquisa “Atlas da Violência brasileira de 2018” – lançada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) – indica que a população preta e parda responde por 71.5% das vítimas de homicídio no país. Entre as mulheres, as negras possuem uma taxa de mortes 71% superior àquelas não negras.

Especificamente quanto às oportunidades de emprego, pesquisas realizadas a partir da década de 1970 e a incessante denúncia de atores e atrizes do Movimento Negro mostraram que o argumento de que vivemos em pé de igualdade democrática de raças é falacioso, pois pessoas pretas e pardas possuem oportunidades e condições muito desiguais na corrida por um alto nível de educação e por vagas no mercado de trabalho. Logo, tais estudos permitiram explicitar de forma científica como o fator raça/cor é deveras relevante nas análises de estratificação social, as quais indicam a existência de desigualdade na mobilidade social ascendente de pretos/as e pardos/as independentemente da classe de origem.

Ocorre que não é possível mais aceitar, num Estado democrático em que a maior parte da população não é da cor branca, que pretos e pardos não tenham representatividade no mercado de trabalho de determinadas carreiras de grande prestígio e reconhecimento social, tal como é o caso da advocacia.

Apenas no início dos anos 2000 e em razão de diversas pressões e manifestações dos movimentos sociais, que a questão étnico-racial se tornou uma preocupação do Estado e começaram a ser desenvolvidas políticas públicas para redução das desigualdades raciais. Ações afirmativas, como as cotas em universidades públicas e as vagas reservadas para candidatos pretos e pardos em concursos públicos são alguns exemplos.

Todavia, no âmbito da advocacia, ainda são poucas as iniciativas voltadas à redução das desigualdades raciais. Por ser o(a) advogado(a) um(a) operador(a) essencial para a defesa da cidadania e por instituições como a Ordem de Advogados do Brasil (OAB) serem parte da defesa da democracia e da igualdade de direitos no país, a representatividade racial é um tema importantíssimo e que já foi ignorado pelos protagonistas dessa carreira por tempo demais.

A desigualdade racial é gritante na realidade cotidiana dos maiores escritórios de advocacia do país, havendo uma participação quase nula de pretos/as e pardos/as em seus quadros, seja como sócios/as, associados/as e estagiários/as. Até hoje, a OAB apenas teve um presidente negro, o advogado Benedicto Galvão que presidiu a seccional de São Paulo em 1940 e 1941[1] . Ou seja, em âmbito federal, sequer houve alguma presidência até o presente que não tenha sido de um branco, num país extremamente rico em pluralidade étnica. E quando se aprofunda a questão para a interseccionalidade entre ser negro e também mulher, o quadro da desvalorização profissional desse grupo é ainda mais atroz.

Fonte: Yahoo!

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