“Muito forte e um tanto amargo”. Ao provar um dry martini pela primeira vez na vida, durante as gravações de “Se eu fechar os olhos agora”, Mariana Ximenes decifrou o sabor de Adalgisa. Personagem que não consta da obra originalmente escrita por Edney Silvestre e publicada em livro, essa “mulher à frente de seu tempo” foi criada por Ricardo Linhares especialmente para a atriz na minissérie de dez capítulos, já disponível no GloboPlay e que estreia nesta segunda-feira (dia 15) na Globo, logo após “O sétimo guardião”. Na trama, ambientada no início dos anos 1960, um brutal assassinato traz à tona segredos de figuras poderosas de uma cidadezinha fictícia do interior do Rio.
Com o indefectível drinque numa mão e um cigarro na outra, a ex-Miss Distrito Federal 1939, interpretada por Mariana, é exuberante e carismática, autora de tiradas muito espirituosas — abaixo, a atriz comenta algumas delas, aplicando as temáticas à sua própria vida. Ao mesmo tempo, a personagem é dona de uma tristeza profunda.
— Adalgisa chora por saudade, mas ninguém sabe do quê. A mão, machucada, é um mistério. Com o marido (o empresário Geraldo Bastos, vivido por Gabriel Braga Nunes), tem um conflito velado. Os dois não brigam, mas são infelizes, carregam segredos e subterfúgios para driblar a solidão: ela bebe e fuma; ele se droga. Ela tinha uma carreira promissora, da qual abdicou pelo status social. Isso minou sua essência — esmiúça Mariana, destacando a complexidade de seu papel: — Apesar de viver de aparências, essa mulher não é falsa. Ao contrário, mostra-se muito franca.
Alheia às convenções da cidade de São Miguel, Adalgisa faz o que quer da própria vida. Veste calças, enquanto senhoras são forçadas a usar saias. E, num impulso ainda mais ousado, envolve-se amorosamente com outra mulher.
— Assim, ela encontra a felicidade. Mas não 100%, porque não consegue viver a relação por inteiro. Os momentos de prazer e liberdade são só momentos, que ela precisa esconder — analisa Mariana, curiosa com a repercussão junto ao telespectador: — Vamos quebrar preconceitos, abrir o coração! Toda forma de amor vale a pena. Eu acredito no amor livre. Nunca me encantei por uma mulher… Mas, por que não? A gente se apaixona pelo ser humano. Não importa o gênero. Luto e vivo para amar e ser amada. Agora, estou apaixonada pelo Felipe (o músico Felipe Fernandes, namorado da atriz há um ano e meio), e espero que seja para sempre.
Se a paulistana de 37 anos fechar os olhos agora, um emaranhado de reminiscências lhe vêm à cabeça. A infância em Groaíras (CE), na casa da bisavó, com a mesa farta de paçoca de carne-seca e a brincadeira com os primos no pé de siriguela. A adolescência em São Paulo, aventurando-se com o irmão pelo metrô a caminho da escola. E, das mais recentes, as vivências em Catas Altas (MG), entre outubro de 2017 e março de 2018, para as gravações da minissérie.
— Acordar, tomar um banho de cachoeira e ir trabalhar é muito incrível, né? No Santuário do Caraça, tem uma igreja em que todo fim de tarde o lobo-guará é alimentado. E a sensação de dirigir um carro de época entre as montanhas, ao pôr do sol, com o lenço ao sabor do vento? Ah… — suspira a atriz, contando que trouxe para a vida a amizade entre sua Adalgisa e a Isabel de Débora Falabella: — Nós duas nunca tínhamos trabalhado juntas, e finalmente aconteceu. O tempo livre por lá nos uniu. Ficávamos em volta da mesa conversando e provando cachacinhas de alambique, comendo queijo, goiabada e muita jabuticaba. Ganhei uma amiga, foi incrível!
“Hoje tô mais pra fósforo queimado”
“Quando estou muito cansada ou triste, perco o brilho. Não tem maquiagem que dê jeito. Sabe o que ‘acende’ alguém de verdade? Sua vontade de viver, de fazer. Existem três palavras de que eu gosto muito e que me regem: vontade, entusiasmo e comprometimento. Se me comprometo a realizar algo, tem que ser da melhor maneira possível. Tenho prazer em tudo o que faço. E só acredito nessa vida com humor, senão fica tudo muito chato”.
“A vida é feita de escolhas. Não fica sentado no banco de trás, assume a direção”
“Demoro para decidir, mas, quando decido, é pra valer. Saí de casa com 17 anos para vir morar no Rio. Aí, tive que tomar as rédeas da minha vida. Lembro que, quando cheguei aqui, o mundo se abriu para mim de um outro jeito: eu era funcionária da TV Globo, estava ficando famosa… Tudo isso é novo e sedutor para uma jovenzinha, né? Das escolhas mais banais às mais complicadas, tudo era comigo: o que comer, a que horas ir dormir e acordar… Mas sempre fui focada, disciplinada. Na minha profissão, não posso correr o risco de ir dormir muito tarde e não acordar com a cara boa e a mente fresca para decorar textos”.
“Tô com abstinência de fazer compras”
“Não sou consumista. Gosto de coisas boas e bonitas, mas sempre dou uma negociada no preço ou espero uma promoção. Aliás, impulsividade não é comigo. Sou muito consciente: paro, penso, reflito, analiso, e só daí eu tomo uma decisão. Sou cuidadosa e cautelosa, com os outros e comigo. Apesar de aberta e disponível para a vida, consigo falar ‘não’. Mas sempre com gentileza. Isso muda tudo”.
“Eu tô mais por fora que umbigo de vedete”
“Não me rotulo sensual nem reservada. Dependendo da situação, posso me apresentar de uma forma ou de outra. Se precisa de doses picantes, boto pimenta mesmo! E uso minha sensualidade como ferramenta no ofício de atriz. Quando o trabalho requer, não tenho pudores. No filme ‘O Grande Circo Místico’, apareci completamente nua e tatuada. Essa foi, com certeza, uma das cenas mais emblemáticas da minha carreira. Em situações assim, é preciso confiar muito no diretor, na história que estou contando, nos parceiros de trabalho… Tem que haver um ambiente de confiança e a certeza de que aquela trama realmente precisa disso para ser mostrada. ‘Se eu fechar os olhos agora’ não teve nudez, mas ‘Ilha de Ferro’ (a atriz participa da segunda temporada da série na pele da psiquiatra Olívia), sim”.
“Os homens se casam por cansaço; as mulheres, por insistência”
“Nunca me casei no papel nem com cerimônia, não achei necessário. Mas, de uns tempos para cá, tenho ido a tantos e tão lindos casamentos, que estou com vontade. Casamento é comunhão, duas alianças juntas formam o símbolo do infinito. Eu e Felipe ainda não moramos juntos, é cedo falar sobre isso, mas quem sabe? Ser mãe também é um desejo forte. Sou madrinha de cinco crianças, com idades entre 1 ano e meio e 13. E sou uma dinda presente, já estou exercitando (risos). Ainda não chegou a minha hora da maternidade, mas vai chegar”.
“Que espécie exótica de mulher é você que nunca mentiu pro marido?”
“Essa fala se encaixa em épocas passadas, quando a mulher assumia um papel reprimido no casamento. Hoje, por mais que o machismo ainda exista, é diferente. Para mim, a verdade é absoluta, sempre! Por mais que doa, é o melhor a se dizer. Prefiro decepcionar com a verdade do que magoar lá na frente com a revelação da mentira contada para encobrir a realidade”.
“Só o adúltero trata bem a esposa, pra aliviar a culpa”
“A partir do momento em que você escolhe alguém e é escolhido, confiança é a base de tudo. Namoro e casamento pressupõem diálogo e respeito, e cada casal tem seu código. Se acordado, vale até relacionamento aberto. Ciúme, para mim, é o perfume do amor: não pode ser em exagero porque incomoda, destrói”.
“Com o tempo, tudo acaba cicatrizando, meu bem. ficar enfaixada destrói qualquer bossa”
“Meus pés são pequenos (ela calça 33/34), eu caio à toa. Mas sabe que nunca quebrei nada quando criança? Em compensação, fraturei o cóccix uma vez no trabalho, rolando da escada durante um filme. Sobre o tempo cicatrizar tudo, tento resolver todas as minhas questões, não guardar rancor. Não tenho problemas em pedir nem em aceitar desculpas. E adoro ouvir e falar ‘por favor’ e ‘obrigada’. Gentileza é sempre bom. Atualmente, posso dizer que zerei todas as relações mal resolvidas. Claro que tenho mais empatia com certas pessoas; com outras, menos. Isso é natural. Agora, inimizades, não. Está tudo certo”.
“Eu tenho azeitonas, meu bem… Um dry martini é uma refeição completa!”
“Minha bebida alcoólica preferida é o vinho, mas também adoro tomar uma cervejinha ou um chope com os amigos. É celebrar, brindar à vida. O dry martini, eu experimentei por conta da personagem, e achei muito forte! E amargo. Adalgisa é mais resistente a bebidas do que eu (risos). E ela fuma, né? Eu nunca fumei, não gosto de cigarro. Foi duro para mim. Meu vício é maratonar séries. Tiro um fim de semana, desligo o telefone e assisto sem parar. Estou na segunda temporada de ‘The handmaid’s tale’, já assisti a ‘Se eu fechar os olhos agora’ toda, pelo GloboPlay, e adorei! Também amei ‘The crown’, ‘Justiça’ e ‘Assédio’”.
“Eu queria trocar meu coração por um fígado. Aí, poderia beber mais e amar menos”
“Tive poucos e bons amores na vida. É que gosto de namoros longos”.
Fonte: Extra