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Plano de saúde x autistas: entre o abandono e a necessidade de cuidados especiais

Desde que o ES Hoje começou a relatar o drama das mães de filhos autistas, primeiramente em relação à dificuldade de acesso ao atendimento público, feito somente pela Apae e Amaes  – que possuem filas de espera intermináveis para acesso aos tratamentos – e, posteriormente, em relação ao descaso dos planos de saúde – cuja indicação a profissionais que não sejam especialistas no transtorno se mostrou constante – o telefone da redação volta e meia toca com mães angustiadas em relação à situação de seus filhos, sem saber o que fazer diante do imenso desafio.

Desta vez, um grupo de mães relatou o descontentamento em relação aos encaminhamentos através da Unimed a clínicas que não contam com profissionais especializados na abordagem ao autista, o que têm levado à regressão no desenvolvimento dos filhos. A reclamação se estendeu à administradora GVix, que presta serviço à operadora encaminhando os pacientes para clínicas seguindo indicação médica. De acordo com as mães, além da falta de profissionais especializados, falta qualificação dos mesmos para trabalhar com a abordagem Aba, considerada o “padrão ouro” para tratar o transtorno.

A representante comercial G.R.C é autista e também tem um filho autista de quatro anos. Ele realiza os tratamentos desde antes dos dois anos e a mãe relata que estava em constante desenvolvimento até a clínica que frequentava ser descredenciada pela Unimed para a prestação do serviço. A experiência na nova clínica, ligada à administradora GVix, não foi satisfatória, segundo a própria mãe.

“A clínica que a Unimed descredenciou, onde meu filho fazia o tratamento, todas as duas profissionais eram pós-graduadas em Aba. Agora, a administradora nos encaminhou para uma clínica cujos profissionais não tinham essa especialização, ou ainda não terminaram. Não tinha organização, nem responsabilidade nos horários com o paciente. Uma vez cheguei e a clínica estava fechada. Já recebi mensagem em whatsapp de última hora querendo remarcar horário. Acontecia de contratar a pessoa para atendimento domiciliar, e essa pessoa faltar”, relata a mãe angustiada, e fala das consequências do descaso para com seu filho.

Regressão
“Meu filho teve regressão no tratamento, começou a urinar de novo. Não usava mais fralda e começou a fazer birra para urinar. Chorava para ir às terapias, jogava biscoito para cima. Quando pegava carro para levar na terapia, não queria entrar, se jogava no chão. Isso é difícil pra mim, porque também sou autista, também me descontrolo nessa situação”, lamenta.

Agora, a mãe relata que, após reclamação, a administradora a encaminhou para uma nova clínica, na qual está na fila de espera há 15 dias para a realização de triagem com psicólogo para fechar o quadro de tratamento do filho. “Pagamos R$ 1.560,00 de plano de saúde, empresarial. Mas meu esposo não trabalha mais na empresa, então servirá até 2021”, explica.

Dor de cabeça até encontrar, e perder
A dona de casa Renata Rodrigues, 35, é mãe de Eric, de dois anos de oito meses, que é portador de autismo moderado e não verbal. Ela, que também é cliente Unimed, afirma que sofreu com muitos profissionais sem capacitação para lidar com crianças portadoras de autismo até chegar a uma clínica na qual o filho começou a evoluir. Entretanto, a administradora que contratava os serviços da clínica foi descredenciada da Unimed.
“Já bati muito a cabeça com outros profissionais sem experiência ou vivência com o autista, sem empatia e profissionalismo com as limitações. Agora que conseguimos uma profissional excelente, na qual estamos partindo para o quarto mês, descubro que ela foi descredenciada. Fiquei doida, porque vejo nitidamente a evolução do meu filho”, conta Renata.

A mãe explica que, se ficasse nas mãos do serviço público, estaria esperando até hoje atendimento e tratamento para seu filho. “Eric está na fila na Amaes e Apae há mais de um ano. O neurologista pelo SUS até hoje não chamou ele”. Renata afirma que seguirá firma na luta para que o filho continue na clínica em que encontrou atendimento adequado. “Não quero perder esse atendimento que nos ajuda tanto, depois de tanto tempo procurando”.

Mães se movimentam por clínica
A clínica CrerSer é considerada o “porto seguro” das mães. Foi lá que elas encontraram o atendimento que tanto tem beneficiado seus filhos. Entretanto, a clínica era conveniada à antiga administradora da Unimed, e acabou sendo descadastradas dos serviços da operadora com a entrada da GVix. As mães têm se mobilizado para que operadora e administradora admitam os serviços da clínica.

A fonoaudióloga Kelly Bravim, proprietária da clínica, que realiza atendimentos de fonoaudiologia, psicologia, terapia ocupacional e psicopedagogia, afirma que os profissionais buscam todas as especializações possíveis para lidar com o público autista. A ciência Aba, considerada de grande eficiência para lidar com o público autista, é desenvolvida na clínica.

“A grande dificuldade dos autistas é a questão comportamental, de não entenderem alguns comandos. Então o objetivo é ensinar isso à criança, através da ciência comportamental. É uma demanda que tem aumentado bastante. Quando o autismo é diagnosticado, grande parte dos neurologistas indicam o Aba para a criança. É necessário um tempo maior com a criança, que precisa ter atendimento todos os dias, envolvendo família, escola, todo mundo. É preciso se doar”, explica Kelly.

O neuropediatra Thiago Gusmão afirma que a ciência ABA é considerada “padrão ouro” no mundo para o tratamento do autismo. “É um tratamento de grande resposta de melhora no condicionamento da criança. Essa análise do comportamento feita por um psicólogo avalia a criança como um todo. Vai realizar uma análise do comportamento e entender quais as necessidades da criança no dia-a-dia, e captar a atenção dela de acordo com a zona de interesse da criança. Por exemplo, se ela gosta de desenho animado, então o tratamento vai entrar no mundo da criança para desenvolvê-la a partir do que ela gosta. Hoje é o método padrão ouro no mundo para o tratamento do autismo”, explica o médico.

Após muita luta, terapias são liberadas
Ivonei Gonçalves é pai de Leí, de cinco anos, diagnosticado com autismo moderado com comprometimento de interação e fala, desde um ano e meio de idade. Suas grandes dificuldades no início dos tratamentos para o filho eram de conseguir profissionais preparados para lidar com autistas e, posteriormente, que desenvolvessem a ciência Aba nos tratamentos. Além disso, ele, que é morador da Serra, tinha que se deslocar em clínicas diferentes, em Vitória, para contemplar todos os tratamentos necessários ao filho.

Ele conta que a demanda de várias mães e pais à Unimed, requerendo o atendimento a partir da ciência Aba – inclusive através de ações judiciais – foi de grande importância para que a operadora, mesmo com certa burocracia, liberasse atendimentos embasados no método.

“Antes dessas liberações que foram acontecendo, os pais entravam na justiça para conseguir autorização do Aba. Porque Aba é uma ciência cujo tratamento é focado em mudança de comportamento e tem dado grandes resultados. Eu consegui liberação depois de toda aquela batalha que os pais já tinham começado”, contou ele, que há três meses conseguiu fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, psicólogo e psicopedagogo pelo plano, “todos utilizando o método Aba”. Além disso, conseguiu com que todas as terapias fossem concentradas na Serra, em uma clínica perto de sua casa.

A Unimed Vitória esclareceu, por meio de nota, que todos os seus clientes têm direito ao atendimento nessa modalidade por meio de prestadores e profissionais qualificados. “Destaca ainda que [a empresa] sempre se mostrou profissional e sensível aos pacientes autistas e suas famílias, buscando oferecer atendimento individualizado e acolhedor. Essas boas práticas são refletidas em pesquisas de avaliação de satisfação, com níveis de excelência, além da oferta de cursos voltados à orientação”. A administradora GVix informou que “trabalha com prestadores e profissionais qualificados, todos com supervisão de uma analista do comportamento”.

Fonte: ES HOJE

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