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Professora quer internar filho viciado à força

“Ele já quebrou a porta de casa, deu chutes, quebrou os objetos do apartamento. Tive que chamar a polícia”, disse a professora (Foto: Rodrigo Gavini/ AT)

A professora aposentada Maria José da Silva, 60 anos, viu Richard, seu filho de 19, pela última vez de relance anteontem quando ele surtou na rua de casa, em Cariacica, e destruiu uma van.

Chorando e desesperada com o paradeiro do filho viciado em drogas desde os 15 anos, ela clama: “Preciso interná-lo! Sozinho, ele não vai parar! É a única solução de salvar a vida do meu menino!”.

Desde então, a professora aposentada vive uma rotina perturbadora de sumiços, dívidas para comprar drogas, surtos quebrando a casa e até de roubo pelo próprio filho.

Quando recebeu a visita de dois oficiais de justiça na porta de casa há dois meses, Richard se desesperou. Informado, por ofício, que seria internado compulsoriamente em três dias, o menino clamou para ser levado imediatamente. Levantou as mãos como se esperasse uma algema, não foi levado e, então, fugiu.

“Qual viciado ficaria esperando depois de ser avisado? Meu filho deu um surto, pegou as coisas dele e sumiu. Ele virou um morador de rua! Está há três meses passando fome. Acho que ele entrou nesse pesadelo das drogas por curiosidade. Ele tem uma vida confortável! Não somos ricos, mas dá para viver”, lamentou.

Após um ano lutando para internar o próprio filho, desde ontem Maria José da Silva conseguiu dois lugares para que ele comece um tratamento: um em Vitória, depois de muita briga com o plano de saúde, e outro em Guarapari, que ela conseguiu com a ajuda de um conhecido.

“Aí, agora que eu finalmente consegui, ele surtou de novo, destruiu a van que ficava estacionada na rua de casa e sumiu de vez! Onde está ele? Eu quero o meu filho! Quando cheguei de Viana, onde estava tentando uma internação para ele, vi a van toda destruída, ele surtando, e fugindo assustado depois do ocorrido. Eu sei que ele não queria ser internado, então nem contava que buscava isso”, conta.

“Estou num desespero há um ano. Eu sou uma mãe estressada e humilhada! Repito a todos: a única forma de salvar meu filho é internando! A família ajuda, mas não é suficiente! É lógico que eles não querem ir por livre e espontânea vontade. Se ele não for internado, não quero nem pensar”.

Questionada sobre o futuro, Maria lembra do passado e chora: “Ele falava: ‘Mãe, quero ser doutor’”.

“Surtava e quebrava a casa”

A TRIBUNA – Com que dinheiro o Richard compra droga?
MARIA JOSÉ – Ele tem acesso ao dinheiro da pensão e usa para comprar drogas. Ele compra e revende celulares e tablets para ter mais droga. O nome do Richard está até no SPC/Serasa.

Ele não frequenta a escola há quanto tempo?
Cerca de quatro anos. Ele parou na quarta série.

Quando você percebeu que seu filho havia mudado?
No dia que ele apareceu na porta de casa embriagado. De lá para cá, quando ele tinha 15 anos, as coisas só pioraram.

Ele é agressivo?
De uns meses para cá, inclusive comigo. Surtava e quebrava a casa. Já quebrou armário, pia, o banheiro, a máquina de lavar. Eu pedia para ele ficar dentro de casa. De prejuízo, já são cerca de uns R$ 10 mil.

Te agrediu?
Verbalmente. Me xingava. E às vezes alguns esbarrões com intenção de me empurrar. Ele já pegou minha carteira.

Ele te roubou?
Tinha dinheiro, documentos e cartões de crédito e débito.

Ele fez dívidas?
Já aconteceu duas vezes. Comprou um celular de luxo e tablets. Ele fica alguns dias em casa e depois some. Por isso, nem sei o que ele faz com isso direito. Já devem ter sido uns R$ 15 mil em dívida de cartão.

Van destruída em Cariacica: jovem viciado teve surto na rua de casa (Foto: )

Você tem boletins de ocorrência na mão…
Ele já surtou e eu chamei a polícia. Ele quebrou a porta de casa, dá chutes, quebra os objetivos do apartamento. Saí de casa, acionei os policiais, que vieram, e fomos para a delegacia. A delegada disse que não adiantava deixar ele preso. Disse que ele precisava de médico, tratamento, de cuidar da saúde. Voltei, então, para a casa. Passaram alguns dias, ele saiu de casa novamente, e eu consegui achar ele à noite. Ele estava muito medroso, acuado. Meu filho é doente! Tentei de tudo! Quando ele fica sem a droga, surta!

Agora que conseguiu dois lugares para internação, após um ano de luta, o que vai fazer?
Vou achá-lo. Vou andar a pé pelas ruas. Eu vou encontrar meu filho e interná-lo. Ele vai se livrar disso. Nem ele está se tolerando mais. Ele falava que ia ser um doutor e de repente acontece isso tudo! E, pelo amor de Deus, do jeito que eu estou sofrendo, tem um monte de mães e pais sofrendo. Agora. Nesse mesmo instante.

Ações fazem Estado gastar R$ 12 milhões

Somente nos primeiros quatro meses deste ano, o governo do Estado já foi obrigado judicialmente a custear a internação compulsória de 436 viciados. Em gastos para o tesouro, dá cerca de R$ 12 milhões – pouco mais de R$ 27 mil por pessoa.

No ano passado, foram R$ 26 milhões. Para o Secretário de Saúde Ricardo de Oliveira, o problema é que a judicialização excessiva “está criando uma segunda porta para o SUS, que tem seu procedimento de acolhimento e tratamento. A judicialização está criando uma outra porta via Justiça. Isso é muito complicado, porque se fura a fila estabelecida.”

“Além disso, o excesso de processos desloca volume de recursos muito grande para um tratamento individual, que poderia estar sendo usado para a saúde pública. Há um deslocamento de recurso substancial. Ao fim, isso mais prejudica o atendimento da população do que ajuda”, reclama Oliveira.

Segundo o Secretário, decisões que obrigam o Estado a bancar internações em clínicas particulares “privilegiam um caso em especial, o que é grave. Cerca de 436 processos é muito. Temos que parar com isso e organizar a rede de saúde”.

Questionado que processos como esses envolvem, muitas vezes, famílias em desespero, Ricardo de Oliveira retrucou que “não pode olhar apenas uma família.”

“Tem decisão judicial que dá gasto de R$ 2 milhões com uma só pessoa. Temos que pegar esse recurso e investir é na rede. Porque assim não estamos conseguindo ampliá-la. E 26 milhões de reais daria uma enorme ajuda”, pondera.

Para o Secretário, internações compulsórias não resolvem efetivamente o problema de viciados, “porque vai e volta toda hora” e “enxuga gelo.”

“Não é esse o tratamento ideal. Temos que montar uma estrutura para fazer o atendimento ser resolutivo, dar assistência. E é um problema do Brasil inteiro. Está, na verdade, uma confusão grande.”Com informações Tribuna Online.

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