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Promotor responsável por apurar tortura em quartel foi contra abertura de investigação

O promotor do Ministério Público Militar (MPM) responsável por apurar denúncias feitas por presos sobre uma sessão de tortura num quartel do Exército na Zona Oeste do Rio foi contra a abertura da investigação. Em 24 de agosto do ano passado, durante a audiência de custódia em que os presos denunciaram agressões feitas por militares, a Defensoria Pública da União (DPU) pediu à Justiça que determinasse que o Exército apurasse o caso. O promotor Mário Porto, então, afirmou não concordar com a abertura de um procedimento para investigar a prática de tortura pelos militares.

Há um mês, o Exército encaminhou o Inquérito Policial Militar (IPM) que apura as denúncias ao MPM. Agora, cabe a Porto denunciar ou não os militares.

De acordo com a ata da audiência de custódia, a que o EXTRA teve acesso, o promotor “opinou pelo indeferimento do pleito (da DPU para que a Justiça determinasse que as denúncias fossem investigadas) considerando que foram anexados autos de exame de integridade física dos custodiados, nos quais nada ficou evidenciado, esclarecendo, por seu turno, que o que temos são apenas as declarações hoje prestadas, ressaltando que devemos considerar, no presente caso, a presunção da veracidade dos atos administrativos, aliado aos exames médicos à época realizados”.

Um dos presos, no dia da audiência de custódia

Porto se referia a exames médicos feitos na 1ª Divisão de Exército, por um médico militar. Ao final da audiência, o juiz Marco Aurélio Petra de Mello decidiu acatar o pedido da DPU, “objetivando não restar quaisquer dúvidas quanto à questão”. No entanto, o CML só abriu o IPM para investigar o caso três meses depois, quando o EXTRA revelou os relatos feitos pelos presos.

A reportagem também teve acesso aos vídeos feitos durante a audiência de custódia. Na ocasião, Porto afirmou aos presos que iria processá-los por denunciação caluniosa se as agressões não fossem confirmadas. “Você confirma essas agressões? Por que, veja bem, nós vamos investigar essas agressões e, caso essas agressões não sejam confirmadas, você comete crime e o MP vai processá-lo por denunciação caluniosa. Você mantém?”, perguntou o promotor.

Procurado, o promotor alegou que não vê problema em conduzir o IPM, apesar de ter sido contra a abertura da investigação.

O promotor do MPM Mário Porto Foto: Divulgação

— O caso segue comigo porque há conexão entre os fatos. Na época, opinei segundo os elementos que tinha em mãos. Agora, vou tomar minha decisão segundo as provas técnicas. Quero, inclusive, pedir que um perito da Polícia Civil ou da PF examinem os laudos. Assim, tiro do âmbito do Exército e mando para uma instituição isenta, que não está envolvida no caso — afirmou o promotor.

O MPM também foi questionado sobre se o fato de Porto ter sido contrário à investigação deveria impedi-lo de conduzir o IPM. Até o fechamento deste reportagem, o órgão não havia se manifestado.

CML concluiu investigação

O EXTRA revelou o caso em novembro do ano passado. Ao todo, 11 presos relatam terem sido torturados após serem presos, durante operação das Forças Armadas no Complexo da Penha, na Zona Norte do Rio. Sete afirmam, em depoimentos prestados em três ocasiões diferentes, que foram espancados com pedaços de madeira e levaram chicotadas com fios elétricos dentro de uma “sala vermelha” na 1ª Divisão de Exército, na Vila Militar. As lesões relatadas pelos presos foram ratificadas por exame médico feito durante a audiência de custódia na Justiça Comum. Os exames feitos na ocasião acusaram uma quantidade maior de lesões do que as apontadas pelo médico militar, no quartel.

Cópia da ata da audiência de custódia

O IPM conduzido pelo Exército, enviado ao MPM em fevereiro, concluiu que não há “provas da materialidade e nem indícios suficientes de autoria relativos aos crimes de tortura e maus tratos”. O responsável pela investigação, coronel Eduardo Tavares Martins, escreveu que “não enxerga na conduta dos militares os elementares integrativos do delito de tortura e maus tratos, tudo não passando da dinâmica de confronto entre supostos traficantes e militares do Exército”.

Um inquérito aberto pelo Ministério Público Federal para investigar o caso ainda está em andamento. Em depoimento no MPF, três dos presos afirmaram terem sido ameaçados por militares no Complexo de Gericinó, onde estão detidos. As ameaças teriam sido feitas em dezembro, quando quatro integrantes do Exército foram ao presídio ouvir os detentos sobre as agressões denunciadas pelo EXTRA. Os presos também alegam que alguns trechos de seus relatos — justamente aqueles em que detalham as torturas sofridas — foram suprimidos da versão final dos depoimentos.

Fonte: Extra

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