Bananal Online

Trinta dias de luto e de luta: Mães de aluno morto e de sobrevivente relatam busca por superação após massacre na Raul Brasil

Situações simples que faziam parte da rotina da técnica em enfermagem Camila Celestino dos Santos, de 33 anos, como comprar roupa ou comida para agradar os dois filhos, se transformaram em tortura. O filho mais velho dela era Douglas Murilo, assassinado no massacre na escola Raul Brasil, em Suzano, há exatamente um mês. Enquanto isso, a rotina de outras mães de vítimas e de sobreviventes do atentado também não é mais a mesma. No caso de adolescentes sobreviventes, as mães buscam ajudar os filhos na superação dos traumas.

Camila, mãe de Douglas, também tem uma filha de 11 anos, que estudava na escola palco do massacre, mas no período da tarde. Ela preferiu trocá-la para outra unidade de ensino e conta que deixar a menina ir à escola virou sinônimo de preocupação ainda que a filha frequente uma escola em outro endereço.

“Ela começou a ir nesta semana, mas eu fico com o coração na mão. Entendo que seja importante ela sair de casa um pouco, ter contato com as outras pessoas, mas o Douglas também estava na escola quando tudo aconteceu”, relembra.

Naquele dia, Camila recebeu uma mensagem de um amigo falando do massacre. Quando chegou à escola, ficou sabendo que o filho tinha sido socorrido e encaminhado ao Hospital Luzia de Pinho Melo, mas, só na segunda vez que retornou à unidade, descobriu que o jovem que havia chegado já sem vida era Douglas.

“Quando encontraram ele, tinha um RG ao lado de nome Caio, então ele deu entrada com este nome no hospital. A assistente social me chamou e perguntou as características dele. Eu contei e ela me disse para eu fazer o reconhecimento. Entrei com uma prima minha. Só pelo tamanho eu já sabia que era ele. Eu gritava muito, mas ao mesmo tempo era algo que não dava para acreditar. A minha ficha está caindo agora, e está sendo cada dia mais difícil”, diz.

Após o reconhecimento do corpo, Camila descobriu que o filho já havia saído da escola, mas retornou para ajudar a namorada Adna Barbosa, e acabou sendo ferido.

Atualmente, a mãe está está em férias do trabalho em busca de forças para retomar a rotina.

Família presente

Gustavo Leite Henrique, de 11 anos, estava na aula de espanhol na manhã do atentado. A porta da sala dele chegou a ser golpeada pelo machado usado por um dos assassinos, mas os criminosos não conseguiram entrar. Depois disso, ele não quis mais passar nem perto da Raul Brasil.

Francini tem faltado ao trabalho para ajudar o filho a retomar a rotina na escola. — Foto: Francini Leite/Arquivo Pessoal

Desde então, mesmo cursando a 7º ano do ensino fundamental em outra escola, ele precisa de alguém da família na unidade durante a entrada, o intervalo e a saída.

“A gente vai revezando entre eu, o pai dele e os meus pais. Quando é o meu dia, eu preciso faltar no trabalho. Ver ele bem de novo é a minha prioridade”, diz a mãe Francini Leite Chicão Henrique, de 30 anos.

No dia seguinte ao ataque, ela começou a levar o filho no psicólogo porque Gustavo tinha pesadelos, sentia muito medo e não queria ficar sozinho.

“Ao mesmo tempo que eu sinto uma impotência em ver ele desse jeito, eu dou graças a Deus que quando eu recebi a ligação no meu trabalho foi para avisar que ele tinha ficado bem. E as mães que foram para avisar que o filho tinha morrido?”, pontua.

Sobre a situação de Gustavo Leite, a Diretoria Regional de Ensino de Suzano informou que tem atendido as solicitações dos familiares dos alunos em relação à ajuda psicológica, mas que os psicólogos atendem apenas na escola Raul Brasil, nas unidades de saúde mental, Unidades Básicas de Saúde e nos quatro Centro de Atenção Psicossocial (Caps).

Ajuda que cura

A psicóloga Sandra Mara Gonçalves é amiga da diretora da escola Raul Brasil. Quando soube do massacre, se prontificou a atender as vítimas de forma voluntária. Desde então, vem oferecendo os horários livres na agenda aos estudantes que precisam de apoio psicológico.

“Eles chegam aqui com sintomas de trauma, com dificuldade para dormir, comer. A gente ainda não consegue falar em transtorno do estresse pós-traumático porque ainda é cedo, e também só psiquiatra que pode fazer este diagnóstico”, diz.

Mas, além deles, Sandra observou que muitos pais ficaram abalados com o que aconteceu e também por ver os filhos sofrendo. Contudo, segundo a psicóloga, com o fato de estarem focados na melhora dos filhos, eles acabam se “tratando” também.

“Enquanto eles vão falando frases para fortalecer os filhos, estão ganhando força junto. Alguns deles estão participando de movimento por segurança nas escolas. Cada um vai seguindo formas diferentes de ressignificar tudo o que aconteceu”, avalia.

Investigação

Desde o início das investigações, quatro pessoas foram detidas. Um menor de idade, de 17 anos, acusado pela Polícia Civil e o Ministério Público como mentor intelectual do crime, está em uma unidade da Fundação Casa desde o dia 19 de março. O advogado de defesa dele, Marcelo Feller, afirma que o cliente “fantasiou”, mas não executou o crime.

O mecânico foi preso na noite desta quarta-feira na zona rural de Suzano. Para a Polícia Civil, ele participou da negociação da arma e da munição que, possivelmente, foram utilizados no massacre. Segundo informações iniciais da investigação, rastros deixados pelos dois assassinos em redes sociais, nos celulares e em suas casas permitiram que a polícia chegasse ao homem.

Na manhã desta quinta-feira (11), outros dois homens foram presos também sob suspeita de negociar arma e munição aos assassinos. Em entrevista coletiva, o delegado responsável pelo caso, Alexandre Dias disse que a negociação foi feita por meio de redes sociais.

Fonte G1

Sair da versão mobile