Em uma nova carta, 15 dos 20 coronéis do alto escalão da Polícia Militar do Espírito Santo (PMES) negaram estarem orquestrando um suposto plano de condução à paralisação das atividades militares no Estado, no que seria uma escalada semelhante à ocorrida na greve de 2017. A carta vem sendo replicada nas redes sociais de militares.
No novo documento, os oficiais afirmam que está ocorrendo “inúmeras manipulações e distorções da verdade”, ao citarem a primeira carta vazada no último dia 1º, onde tecem duras críticas à gestão da Corporação e ao governo capixaba. Na carta desta quarta-feira (8), os militares dizem “repudiar com veemência as falsas ilações e afirmações”. O coronelato afirma que o documento vazado à imprensa não foi uma ameaça ao governo. Mesmo tendo criticado fortemente a gestão do comandante-geral, superior hierárquico da Corporação, os coronéis dizem na nova carta que defendem a “lei, ordem hierarquia e disciplina”.
“O que obviamente se trata de uma campanha caluniosa e difamatória perpetrada por interesses escusos, sem qualquer compromisso com a proteção da sociedade, o que não é o caso destes coronéis, fiéis defensores da lei e da ordem, da hierarquia e da disciplina, conforme já se testemunhou no passado e até hoje por seus pares e subordinados. Quanto aos agentes responsáveis por tamanha leviandade serão adotadas as medidas judiciais própria”, afirmam os 15 coronéis na carta desta quarta (8).
Explicam ainda que o documento anterior “era de natureza interna, dirigido a autoridade máxima da segurança pública, mediante ciência dada ao Comandante -Geral”. E que visava “tão somente solicitar agenda de reunião do coronelato justamente para que fossem reestabelecidos os canais de comunicação internos essenciais para a boa gestão estratégica da corporação, sobretudo os que envolvem assuntos sensíveis de interesse geral da Instituição”.
O comandante-geral da PM, coronel Douglas Caus, foi apenas avisado oralmente da carta, não recebeu o documento inicialmente, que foi endereçado ao Secretário de Segurança Pública do Estado, coronel Alexandre Ramalho. No dia seguinte à carta inicial, quinta-feira (2), realizou uma reunião com os 20 coronéis que compõem o alto comando da PMES, e houve gritaria conforme apurou a reportagem.
GOVERNADOR REBATEU CORONÉIS
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), se manifestou após a divulgação de uma carta de coronéis do alto escalão da Polícia Militar capixaba com duras críticas à gestão da Corporação e ao governo do Estado. Segundo Casagrande, não estão dadas as condições para nova greve da PM e que as reclamações dos coronéis estão sendo debatidas internamente. O governador acrescentou ainda que a categoria precisa reconhecer e celebrar as conquistas.
“É bom solicitar reajuste e ter outras demandas, mas é importante que reconheçam o que foi feito, porque se não se animar com o que foi feito, vai ficar eternamente insatisfeito”
Renato Casagrande – Governador
No documento enviado por um grupo de coronéis ao secretário de Segurança Pública, Alexandre Ramalho, no último dia 1º, é feita menção à greve da PM de 2017. Na carta, os coronéis citam o que chamaram de “clima de inquietação na tropa”. Subentende-se que o documento traz uma ameaça ao governo, ao citar a greve da PM de 2017. “Sobressalta uma inquietação em vários níveis, que tem sido vivenciada no dia a dia desse colegiado da Corporação. A preocupação maior é certamente a formação de um cenário, já presenciado em tempo pretérito, onde a ausência de diálogo conduziu para consequências inesquecíveis e danosas para toda Corporação“, diz.
Casagrande, no entanto, diz que não existe ambiente para nova greve. “Hoje temos diálogo, investimento, respeito e um histórico do que foi feito nos meus governos (2011 a 2014, e nos anos de 2019,2020 e 2021), e que tenho certeza que a maioria dos policiais reconhece”, bradou.
O governador lembrou que foi aprovado um reajuste para os militares estaduais que vem sendo pago desde o ano passado. “Um reajuste que estamos aplicando até dezembro de 2022. Foi a única categoria que recebeu. Agora estamos analisando o reajuste linear, o percentual daremos a todos”, disse.
Por fim, o governador ressaltou que tem investido pesado na segurança pública do Espírito Santo e que vem reestruturando as forças de segurança do Estado. “Foram investimentos recordes”, disse.
A ‘CARTA DA REVOLTA’ DOS CORONÉIS
Uma carta assinada por 15 dos 20 coronéis do Alto Comando da Polícia Militar do Espírito Santo (PMES), e enviada ao secretário de Segurança Pública do Estado, Alexandre Ramalho, por volta das 14h30 desta quarta-feira (1º) foi recebida com perplexidade dentro do governo. No documento, obtido por A Parresia, os coronéis relatam estarem insatisfeitos com a gestão da corporação e cobra mais diálogo com o governo do Estado. Atualmente a PM capixaba é comandada por coronel Douglas Caus. O artigo 149 do Código Penal Militar prevê pena de prisão para militares que ofereçam recusa de obediência ou resistência à ordem de superiores. O Comandante geral da PM é a maior autoridade na corporação e os coronéis são subordinados à ele, bem como ao governador Casagrande.
TRECHO DO CÓDIGO PENAL MILITAR
Art. 149. Reunirem-se militares ou assemelhados:
I – agindo contra a ordem recebida de superior, ou negando-se a cumpri-la;
II – recusando obediência a superior, quando estejam agindo sem ordem ou praticando violência;
III – assentindo em recusa conjunta de obediência, ou em resistência ou violência, em comum, contra superior;
IV – ocupando quartel, fortaleza, arsenal, fábrica ou estabelecimento militar, ou dependência de qualquer deles, hangar, aeródromo ou aeronave, navio ou viatura militar, o utilizando-se de qualquer daqueles locais ou meios de transporte, para ação militar, ou prática de violência, em desobediência a ordem superior ou em detrimento da ordem ou da disciplina militar:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito), com aumento de 1/3 (um terço) para os cabeças.
A carta afirma haver um suposto clima de insatisfação nos quadros da PM que poderia levar à uma nova paralisação. De acordo com a Constituição de 1988, membros das Forças Armadas e policiais militares não podem fazer greve. A proibição foi estendida a policiais federais e civis em entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) de 2017.
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A carta dos coronéis, no entanto, diverge das ações do governador Renato Casagrande (PSB), que desde quando assumiu o governo relata ter encontrado as polícias sucateadas e afirma, reiteradamente, que vem reestruturando as forças de segurança com investimentos em estrutura, viaturas, armamento e no quadro de servidores por meio de concursos.
Veja o nome dos coronéis que assim a carta:
- CEL QOCPM Alessandro Juffo Rodrigues – diretor de Administração de Frota
- CEL QOCPM Alessandro Marin – diretor de Educação
- CEL QOCPM Carlos Alberto Bariani Ribeiro – comandante do 5° Comando de Polícia Ostensiva Regional (CPOR)
- CEL QOCPM Carlos Ney de Souza Pimenta – comandante de Policiamento Ostensivo Especializado
- CEL QOCPM Edmilson Batista Santos – diretor de Saúde
- CEL QOCPM Evandro Teodoro de Oliveira – diretor Ciodes Metropolitano
- CEL QOCPM Jose Augusto Piccoli de Almeida – controlador da PMES
- CEL QOCPM Laurismar Tomazelli – comandante do 6° Comando de Polícia Ostensiva Regional (CPOR)
- CEL QOCPM Moacir Leonardo Vieira Barreto Mendonça – corregedor da PMES
- CEL QOCPM Marcelo Pinto Abreu – Comandante Do 1° Comando de Polícia Ostensiva Regional (CPOR)
- CEL QOCPM Marcio Eugenio Sartorio – diretor de Finanças
- CEL QOCPM Odilon José Pimentel – comandante de Policiamento Ostensivo Noroeste
- CEL QOCPM Oscar Paterline Mendes – comandante de Policiamento Ostensivo Norte
- CEL QOCPM Paulo Cesar Garcia Duarte – diretor de Logística
- CEL QOCPM Robson Antonio Pratti – diretor de Direitos Humanos e Polícia Comunitária
DOIS EX-COMANDANTES ASSINAM ‘CARTA DA REVOLTA’
A carta é assinada por dois ex-comandantes da PM. Um deles é coronel Moacir Leonardo Vieira Barreto Mendonça, que ocupou o cargo no início da administração de Renato Casagrande, momento em que foi concedida anistia aos PMs, Em novembro de 2019 ele deixou o cargo, que foi assumido pelo coronel Márcio Eugênio Sartório, sucedido quatro meses depois pelo atual comandante, coronel Douglas Caus, em abril de 2020.
TEOR DA CARTA
“Por inúmeras vezes, solicitamos ao Comandante Geral a abertura do diálogo e a prática da liderança junto a seus Coronéis para compartilhar os assuntos estratégicos e de interesse da Corporação. Porém, não houve êxito até o momento, com a omissão dessa assessoria ou procrastinação de soluções institucionais sugeridas”, diz os coronéis na carta.
Subentende-se que o documento traz uma ameaça ao governo, ao citar a greve da PM de 2017. “Sobressalta uma inquietação em vários níveis, que tem sido vivenciada no dia a dia desse colegiado da Corporação. A preocupação maior é certamente a formação de um cenário, já presenciado em tempo pretérito, onde a ausência de diálogo conduziu para consequências inesquecíveis e danosas para toda Corporação“, diz.
Os coronéis que assinam a ‘carta da revolta’ endossa a ameaça ao governo quando falam em “estado de alerta”. “Neste sentido, os Coronéis que aqui subscrevem se mantêm fiéis a seu papel de assessoramento e compromisso institucional, entretanto, a forma de condução dos assuntos aqui tratados proporcionam uma desmotivação e insatisfação que se auto propaga internamente. Dessa feita, não resta outra alternativa, por condução a este estado de alerta, requerer uma reunião presencial e colaborativa com vossa excelência, em regime de urgência”.
A reportagem de A Parresia apurou que um dia após o envio da carta, por volta das 15h30 desta quinta-feira (2), os 20 coronéis se reuniram no Quartel do Comando Geral da PM em Maruípe/Vitória. De acordo com a apuração, a reunião foi tensa e teve gritos. Fontes dizem que o comandante-geral da PMES, coronel Douglas Caus, não recebeu cópia do documento, mas foi informado sobre a carta enviada ao secretário de segurança.
Militares ouvidos pela reportagem afirmam que a conduta dos 15 coronéis, com a carta, trata-se de um atropelo grave à disciplina militar e que os mesmos “não falam em nome da corporação, atualmente, representada pelo comandante-geral”.
O QUE DIZ O GOVERNO
A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) disse em nota, que o documento do grupo de coronéis foi encaminhado para o secretário Alexandre Ramalho, que por sua vez, destinou ao comandante-geral da PM. “Instância a qual o mesmo deveria ter sido endereçado. O conteúdo será avaliado”, diz a nota.
Fonte: A Parresia